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Por
Luiz Flávio Gomes
O
senador Aécio Neves (PSDB-MG) afirmou que não perdeu a eleição para um partido
político, sim, para uma “organização criminosa” (falou isso sob o calor e o
impacto gerado pela estrondosa corrupção na Petrobra$).
O
PT seria, então, uma organização criminosa? Aécio lançou um “factoide” e o PT
reagiu com outro, seja porque levou o tema ao Judiciário, seja porque continua
falando em “golpe” e “terceiro turno”. Chegou a hora de pensarmos no Brasil, na
nação, nos seus mais graves e profundos problemas: gestão/governança,
corrupção, violência e desigualdade.
A
casa está pegando fogo e seus moradores estão discutindo quem esqueceu o feijão
no fogão! O país permanece em clima eleitoral (sublinha Marco Aurélio Nogueira,
Estadão, aliás 7/12/14): “Os protagonistas das urnas de 2014 não retocaram a
maquiagem. Continuam lambendo as próprias crias e as próprias feridas, a
mastigar a mesma ração insossa que ofereceram aos eleitores.
Nenhuma
manobra diferente, nenhuma análise prospectiva, nenhum realinhamento de forças,
nenhuma atitude de grandeza. O diálogo anunciado pela presidente ficou no
terreno protocolar, as oposições nem sequer estão pagando para influenciar o
que virá pela frente. Todos parecem encantados, à espera dos frutos que virão
do escândalo da Petrobras (…) O parafuso espanou e quanto mais petistas e
tucanos insistirem em forçar a chave de fenda maior será o estrago”.
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02. O Brasil constitui desde sempre (de 1500 até hoje) um dos paraísos
mundiais da cleptocracia (Estado governado por ladrões: para o período colonial
leia-se Padre Antonio Vieira, O sermão do bom ladrão, e Padre Manuel da Costa,
suposto autor do livro A arte de furtar). Ainda vivemos “a transição do estilo
mafioso de manter a ordem para o institucional que nosso País ainda não
concluiu” (H. Schwartsman). No plano legal (formal, institucional), muita coisa
já foi feita (criação de um poder jurídico para o controle da corrupção e dos
ladrões do dinheiro público, leis anticorrupção, lei da transparência etc.); o
problema continua residindo na eficácia concreta de todos esses mecanismos de
controle e de transparência, que funcionam muito precariamente, fomentando
desse modo, dentro do Estado, a roubalheira, a gatunagem, a rapinagem, o
patrimonialismo (confusão do patrimônio público com o privado) etc. A
cleptocracia (como regime político-econômico que sufoca a democracia), sem
sombra de dúvida, tem como combustível as organizações criminosas. Para se
saber o quanto a cleptocracia já usurpou da democracia brasileira, portanto,
vale a pena passar os olhos nas nossas organizações criminosas, especialmente a
dedicada à pilhagem do patrimônio público, comandada pela plutocracia (Estado
governado pelo poder das grandes riquezas) que, com certa frequência, usa seu
poder não só para promover a concentração da riqueza (gerando desigualdade
extrema e muita pobreza), senão também para a prática de ilícitos penais
(inserindo-se assim na constelação das várias organizações criminosas).
03. Hoje estão operando (no território brasileiro) quatro grandes
organizações criminosas: (1ª) o crime organizado dos poderes privados, que
exploram particularmente a venda de drogas e se caracterizam pelo uso constante
da violência (PCC, PGC, CV, Alcaeda, Narcotráfico dos morros do RJ etc.); (2ª)
o crime organizado das milícias (que exploram favelas e bairros pobres de
muitas cidades); (3ª) o crime (mais ou menos) organizado que emerge de dentro
das bandas podres das polícias (que praticam assassinatos, desaparecimentos,
extorsão, roubos, sequestros e que também morrem amiúde) e (4ª) o crime
organizado multibilionário, composto por poderosos bandidos do colarinho branco
(membros da plutocracia, da política e dos altos escalões administrativos), que
eram chamados (nos EUA) no século XIX de “barões ladrões”; por meio de fraudes,
proteções, monopólios e conluios licitatórios (carteis), como nos casos da
Petrobra$ e do metrô$P, o crime organizado multibilionário está estruturado
sobre a base de uma troyka maligna (partidos, políticos, e outros agentes
públicos + intermediários (brokers) + agentes econômicos e financeiros) que se
unem em Parceria Público/Privada para a Pilhagem do Patrimônio Público (P6).
04. Os crimes organizados são protagonizados, evidentemente, por ladrões
(cujos escopos consistem em fazer do alheio o próprio), que se valem da trapaça
e do engodo, da corrupção e da violência, para alcançarem suas vantagens
(normalmente econômicas) em prejuízo de terceiras pessoas ou de toda sociedade.
O Estado brasileiro, como um dos paraísos da cleptocracia, vem provando a
experiência de compartilhar suas funções com as organizações criminosas
citadas, que exercem ou comandam várias das suas funções (ou seja: os ladrões
“estão governando” porções consideráveis do Estado). Vejamos: o crime
organizado privado como o PCC governa os presídios (mais de 90%, conforme
Camila Dias, “PCC – Hegemonia nas Prisões e Monopólio da Violência”, Editora
Saraiva); as milícias substituem o Estado prestando ajudas sociais às favelas e
aos bairros pobres; os policiais da banda podre organizada são representantes
diretos do Estado (e governam a segurança pública); por fim, o crime organizado
multibilionário (incluindo o da Petrobra$, do metrô$P etc.) é comandado por
integrantes da plutocracia nacional ou estrangeira (que governa o Estado por
meio do poder do dinheiro das grandes riquezas, que cooptam o poder político
mediante o “financiamento” das caríssimas campanhas eleitorais, “comprando-o”
dessa maneira).
05. O Brasil, como era de se esperar, sendo um dos mais pujantes paraísos
da cleptocracia mundial, não ocupa boa posição no Índice de Percepção da
Corrupção da Transparência Internacional – 69º colocado. Já com cinco séculos
de tradição, não é governado apenas por gente bem intencionada, senão também
por várias organizações criminosas (repita-se: cada uma cumprindo ou comandando
parcelas das funções estatais). No que diz respeito ao papel desempenhado pelos
político$ e partido$ políticos, sabe-se que (a quase totalidade deles, com
raríssimas exceções), desde que foram constituídos (na época do Império), são useiros
e vezeiros no desvio do dinheiro público de seus fins legítimos (o PT e o PSDB,
claro, com seus respectivos mensalões bem como com os escândalos da Petrobra$ e
do metrô$P, dão evidências exuberantes do que acaba de ser afirmado). É por
meio dessas formas criminosas de exercício do poder que os políticos e os
partidos (feitas as ressalvas devidas) forjam os famosos “fundos de campanha”,
que pagam os serviços eleitorais, que arranjam afilhados e asseclas e que
remuneram as custosíssimas campanhas marqueteiras (que transformam os
candidatos e os partidos em verdadeira mercadoria de consumo).
06. É mais que visível, depois de 514 anos, o desmoronamento de todo nosso
edifício social, político e moral, que não passa de efeito funesto e deplorável
do engodo, da corrupção e das maledicências impingidos a toda sociedade pelos
acelerados ladrões, egoístas e gananciosos, que buscam o lucro com os nossos
males, dissabores, misérias e discórdias (reais e virtuais). O que mais nos
causa estupefação, na contemplação deste desonroso quadro de monstruosidades
morais, é ver como que muitos brasileiros (direta e diariamente afetados pelas
nefastas consequências da cleptocracia, que é uma das formas mais anômalas de
democracia) ainda se comprazem em persistir na sua indiferença e cegueira, como
se o horizonte tosco e deletério desenhado para nosso país fosse decorrência de
uma lei implacável e irremovível da natureza ou algo despejado sobre os ombros
dos compatriotas como punição de um raivoso ser sobrenatural (um daqueles deuses
embrutecidos da imaginosa mitologia grega).
07. Desde Heródoto, na Grécia Antiga (como sublinha Antonio Gasparetto
Júnior, texto-net acessado em 6/12/14), o humano sonha com um governo cristalinamente
democrático. Sonho nunca realizado integralmente. Para quem ostenta a fama de
ser um cobiçado paraíso da cleptocracia (de sobra, autoritário e violento), um
governo eficiente e honesto, desgraçadamente, nunca passou de uma utopia.
Somente na literatura (ver A Cidade do Sol, de Tomasso Campanhella e Utopia, de
Tomas Morus) é que vemos sociedades bem geridas onde não teríamos problemas
sociais, morais e políticos. “Mas é claro que lugares assim são, se não
impossíveis, pelo menos muito improváveis, já que homens possuem interesses
que, mesquinhos ou não, são suficientes para causar grandes desavenças e romper
com qualquer possibilidade de equilíbrio em uma sociedade” (Gasparetto,
citado).
08. Infelizmente, para nós e para toda a humanidade desde a época de
Heródoto, passando pela Idade Média (séculos V-XV), pré-modernismo (séculos
XVI-XVII) e modernismo (séculos XVIII-XX), até chegar ao contemporâneo
pós-modernismo, a utopia do governo democrático honesto possui uma expressão
bem real e tangível de seu oposto, o governo cleptocrático, onde o Estado
cumpre a tarefa de uma “máquina de extração e concentração de renda e, ainda
por cima, também por meios ilegais”. Isso quer dizer que, “além da arrecadação
de impostos, taxas e tributos que os Estados cobram para acúmulo legal de
renda, muitos dos indivíduos que formam a máquina administrativa, insuflados
normalmente por gente da plutocracia, ainda fazem uso benéfico de suas posições
para enriquecimento próprio”. Não é por menos que o significado literal do
termo cleptocracia seja a de um Estado governado por ladrões.
09. A ciência política nos explica (continua Gasparetto, citado) “que
todos os Estados tendem a se tornar cleptocratas na ausência de manifestação da
sociedade”. Os economistas e filósofos argumentam “que o capital social da
sociedade é forte elemento para impedir a instauração de tal governo
cleptocrático”. Não encontrando obstáculos sociais (reação enérgica da
sociedade civil, que continua inerte e indiferente), a cleptocracia avança e o resultado
mais nefasto acontece quando ela “substitui ao Estado de Direito” ou, pior, o
utiliza indevidamente (ver Ugo Mattei e Laura Nader, Pilhagem), para se
apropriar do poder e do dinheiro público, como se fosse patrimônio privado
(patrimonialismo). O estágio último (já alcançando píncaros inimagináveis)
dessa degenerada construção societal e estatal se aperfeiçoa quando se
concretiza a captura do sistema público governamental pela junção da corrupção
política com a econômica (empresarial).
10. Um dos executivos da Toyo Setal, Augusto Ribeiro de Mendonça Neto,
disse (24/11/14) que parte da propina que pagou ao PT, entre 2008 e 2011, foi
por meio de doações legais, que se transformaram, como se vê, em instrumento de
lavagem de dinheiro sujo. Quem garante que os demais partidos políticos não
receberam as mesmas propinas por meio dessas doações declaradas ao TSE? Isso é
o que significa o uso indevido do Estado de Direito para a pilhagem do
patrimônio público (uma pilhagem dentro da lei). Outro executivo da mesma
empresa, Júlio Camargo, afirmou que o dinheiro sujo teria circulado por dutos
paralelos (caixa 2), sendo parte dele depositada em contas no exterior. Pior
ainda: tanto Paulo Roberto Costa como Youssef estão declarando que o escândalo
da Petrobra$ era apenas uma das pontas do monstruoso iceberg, a comprovar a
nossa qualidade degradante de paraíso da cleptocrática, onde os partidos
políticos indicam diretores para as grandes empresas públicas, com o fito de
forjarem os abjetos “fundos de campanha”. Como devemos ler a notícia de que
Sérgio Machado vai deixar a presidência da Transpetro, mas que o cargo
continuará sendo de indicação de Renan Calheiro$?
11. Bem poucos são (parafraseando João Francisco Lisboa, Jornal de Timon)
os que confidencialmente e nas conversações particulares (reservadas) não
reconhecem e confessam a situação deplorável a que chegou nosso paraíso da
cleptocracia, governado não só por gente de bem, senão também por ladrões e
organizações criminosas de todas as estirpes e colorações ideológicas e
partidárias. Mesmo assim, muitos ainda continuam a se prestar de instrumento
(por ação ou por omissão, que nesse caso significa conivência) para a
perpetuação do exercício dessa infernal política falaz e perniciosa praticada
diuturnamente por ladrões sem consciência e amor à pátria, à nação. É bem
provável que o despotismo de uma causa tão mesquinha acabe por amortecer nos
corações dos que o sofrem o brio da independência, da luta, do grito de
libertação, que emergiria inconteste e retumbante de todas as gargantas se elas
fossem alimentadas pelo fogo do patriotismo e do amor pela construção de uma
verdadeira e decente nação. Nosso grito de libertação (se acontecer) tem que
ter destino certo: (a) tolerância zero com os políticos corruptos (cassação imediata
dos que comprovadamente praticaram corrupção); (b) rígido controle da coisa
pública, que inclui punições severas (dentro do Estado de Direito) a todos os
bandidos do colarinho branco; (c) o fim da reeleição para cargos no executivo e
(d) o fim do político profissional (limitação de mandatos no legislativo).
PS - Participe do nosso movimento fim da reeleição (veja
fimdopoliticoprofissional. Com. Br). Baixe o formulário e colete assinaturas.
Avante!
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