domingo, 7 de junho de 2015

Afinal, o que pretende Júlio Alves?

A Câmara Municipal de Caraguatatuba votou em sua última sessão (2/jun/15) um projeto de autoria do vereador Júlio Cézar Alves que cria uma comissão especial destinada a proceder à redistribuição física dos bairros da cidade.

Denominada “Comissão de Assuntos Relevantes”, uma CAR, pretende o autor, na companhia de outros dois colegas, fazer um levantamento de todos os bairros de Caraguá, delimitando fisicamente onde termina um e onde começa o outro, e fixando, em definitivo, seus respectivos nomes.

A questão da denominação dos bairros é polêmica e antiga. De há muito se questionam como surgiram o nome de cada bairro do município, alguns curiosos como o Risca-Faca. De bate-pronto, parece sugerir algo depreciativo, mas na verdade nada possui de ofensivo aos seus moradores, um reduto de pescadores locais, talvez os últimos dos caiçaras.

Na verdade, o plano diretor da cidade, votado não faz muito tempo, já se ocupou de subdividir o município em territórios geográficos distintos, dando a cada um deles um tratamento diferenciado, levando-se em conta sua vocação turística, concentração popular, questões ambientais e tipos de usos e de atividades comerciais, de apoio e de serviços.

Com o novo plano diretor, por exemplo, a região Sul seria o local de concentração de indústrias e serviços, levando muitos a afirmar que o crescimento da cidade, daqui para frente, seria deslocado para aquela região, que por isso mesmo ficaria muito valorizada em termos imobiliários. A base da Petrobras e o Shopping Center Serramar são citados para sustentar essa opinião, somando-se a vasta área, ainda plana e sem destinação, na divisa com São Sebastião, que muito bem poderia servir de atrativo a instalações industriais.

Seguindo igual raciocínio, a região Norte ficaria disponível para os investimentos turísticos de maior impacto, além de abrigar áreas nobres para a construção de residências de luxo, loteamentos de alto padrão, construção de hotéis, resorts, atividades turísticas de apoio, como marinas e outras. Seria o local para descanso e de lazer, em contraponto às atividades atribuídas à região Sul.

Não se sabe até que ponto uma divisão territorial para fins econômicos moveria o vereador Júlio Cézar Alves a criar a sua comissão. A sua intenção parece menos econômica e mais política. Ao delimitar bairros, pretende que isso sirva para uma acomodação dos moradores, resolvendo-se em definitivo a questão da denominação dos locais em que cada um mora, e nada mais que isso.

Como o nome dos bairros não é fixado por norma rígida, como lei ou decreto, mas sim pela tradição de sua gente, é natural que ocorram desencontros e imprecisões não intencionais. Quando as coisas seguem normalmente o seu curso, sem a precisão técnica, é de se esperar que surjam as dúvidas que agora o vereador pretende ver solucionadas.

Cogita-se no Congresso Nacional mudar o sistema de eleições de cargos políticos em todos os níveis de governo –federal, estadual e municipal–, com grandes possibilidades de vir a ser adotado o voto distrital, ou distrital misto. Há quem afirme que essa nova forma de votação “virá de qualquer jeito”, sendo apenas uma questão de tempo.

Estaria o vereador já visualizando essa nova forma de eleição e já preparando terreno político? Quem conhece Júlio Alves e o jeito simples e tranquilo com que encara as questões, mesmo as mais empolgantes, sabe que não há qualquer intenção mesquinha em suas abordagens, afastando-se assim o caráter eleitoreiro de sua pregação.

Outro ponto também a ser considerado é o fato de o bairro Porto Novo já ser considerado distrito, que é o primeiro passo para que um ajuntamento populacional venha a transformar-se em município. Ou seja, já sendo distrito, o Porto Novo poderia pleitear sua independência política, podendo fazê-lo desde já, pois reúne todas as condições para isso, bastando apenas seguir a legislação que exige coisas como a realização de plebiscito para colher as impressões de sua população sobre o tema, chancelando sua decisão.

Estaria o vereador dando o pontapé inicial para ganharmos um novo município vizinho, com perda de território e de impostos que são gerados naquela região, certamente consideráveis aos cofres públicos? Leve-se em conta que o Porto Novo não é bairro isolado, achando-se ladeado por outros tantos que somam ao seu espaço físico.

Também é de se considerar que, nesta discussão toda, poderia haver a pretensão de se anexarem partes de outros municípios ao território de Caraguatatuba. É sabido que o prefeito Antônio Carlos andou sondando os moradores de Pouso Alto em suas intenções de fazer parte de Caraguá, e assim poderem se utilizar da estrutura de nossa cidade, que fica bem mais perto e acessível do que o núcleo central de Natividade da Serra, município a que pertencem.

Será que também não estaria afastada a possibilidade de se estenderem as divisas de Caraguá até a atual Enseada, em direção a São Sebastião, ou até o Maranduba, em Ubatuba? No passado, já houve vereadores, como Aureliano Gonçalves Pereira, o AG Pereira, que defendeu essa ideia ao constatar um grande número de eleitores em Caraguá morando no bairro do Sertão da Quina, em Ubatuba. Em relação à Enseada, a situação é idêntica.

Se o trabalho do vereador pretende ater-se somente à nomenclatura dos bairros, conforme ele próprio informa, pode haver por trás desses estudos uma ação política oportunista, ainda não delineada e talvez nem pretendida pelo autor, com vistas a alargar as atividades dessa comissão, com a transformação do Porto Novo em município, ou a anexação, ao perímetro de Caraguá, de Pouso Alto, Maranduba ou Enseada. Por que não?

Isso não seria nada surpreendente, já que a ideia de anexação entre municípios não é nova. São Sebastião, de maneira pouco cortês, já quis, num passado recente, por seus vereadores, apoderar-se das áreas de Caraguá a partir do Rio Juqueriquerê, aumentando assim a sua área territorial à custa do “filet mignon”, que é a nossa área plana da região Sul. Claro, essa intenção acabou defenestrada.

Em 1991, o bairro Tabatinga, por seus poderosos, que acham que a tudo têm direito e tudo podem, já tentou dar seu grito de independência de Caraguá, transformando-se em município. Um dispositivo colocado na Lei Orgânica Municipal de Caraguá meio às pressas pelo então vereador Almir Alves, tio do Júlio Alves, mandou para a estratosfera as intenções separatistas dos tabatinganos dos milhões.


De qualquer forma, fica a pergunta: o quê, afinal, pretende o vereador Júlio Cézar Alves?

Francisco Antonio Lourenço
Por e-mail

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