segunda-feira, 12 de março de 2012

Curiosidade: como era feita travessia do Juqueriquerê quando não havia ponte?

E o que significa Juqueriquerê?

Ao passar por sobre o Rio Juqueriquerê ninguém costuma refletir muito acerca das coisas do nosso passado mais distante, como se a história pouco significasse e que o importante é viver o presente, com suas atribulações, acertos e desacertos, sempre em busca de algo que o próprio homem nunca sabe ao certo o que é.

foto: Caraguablog
O Rio Juqueriquerê tem histórias. Mas, antes de responder como as pessoas atravessavam o rio quando não existia ponte, precisamos nos situar melhor e saber o que exatamente significa “Juqueriquerê”. Não basta dizer que é palavra de origem indígena, originalmente grafada “Juquery-querê”, pois isto é o óbvio. Queremos o significado.

Em dissertação apresentada ao programa de pós-graduação da Universidade Estadual Paulista, Unesp, de Araraquara-SP, para obtenção do título de Mestre em Sociologia, Sílvia Regina Paes, uma nativa do Porto Novo, nos fornece o sentido do vocábulo: “Juqueriquerê significa, segundo os moradores de lá [Porto Novo], a ‘planta que dorme’, por ter uma quantidade grande de uma espécie de planta que, ao encostarmos nela, parece murchar”.

A mestranda se baseou em Sampaio (1978:364) para indicar a origem da palavra. É Sampaio que afirma que Juqueriquerê significa planta dorminhoca ou sensitiva. É a “dormideira” que conhecemos hoje, comum em qualquer parte da cidade e que abundava nas margens daquele caudaloso rio da nossa zona sul. Ao leve toque, a planta se fecha toda, constituindo exceção no reino vegetal por ter a sensibilidade exacerbada.

Bem, Juqueriquerê, planta que dorme, avançamos. Mas voltemos à pergunta inicial: antes da construção daquela ponte em arco que caracteriza o bairro Porto Novo, sobre o rio das plantas dorminhocas -- hoje com duas pistas e passarela para pedestres e ciclistas --, o que tínhamos? Isto é, como as pessoas atravessavam o rio?

A questão é intrigante. Outro dia, remexendo nas pastas do computador, encontrei uma foto que esclarece essa curiosidade. Não sei a sua origem, mas deve ser fruto de algum trabalho elaborado pela Fundacc, que possui vasta documentação sobre a história da nossa cidade e das nossas gentes. Só não sei como foi parar no meu PC.

clique na foto para vê-la aumentada
A foto mostra uma balsa de madeira, toda rústica, conforme se vê ao lado. As anotações feitas à mão parecem responder à indagação: “Balsa do Rio Juqueriquerê. Travessia de animais e pessoas e depois carros até ter a ponte de madeira, com a estrada. Foto em 1926 x 1929 (Arquivo Alvinho) – São Sebastião-SP – tel. xx-12-4521699 – Agnello – Outrora a divisa dos municípios”.

A foto pode ser mesmo de 1926 ou 1929, como sugere, mas não a anotação. Isto porque o Rio Juqueriquerê deixou de ser a divisa dos municípios de Caraguatatuba e São Sebastião em 1964, através da Lei Estadual nº 8.092, de 28 de fevereiro, que reorganizou o quadro territorial e administrativo do Estado. A partir daí, a linha divisória entre os municípios foi estabelecida no Rio Perequê-Mirim, com Caraguatatuba ganhando território e São Sebastião perdendo espaço.

Portanto, respondendo objetivamente à questão inicial, a balsa mostrada na foto é a que fazia a travessia de pessoas, animais e posteriormente de carros. Assim operava até o advento da construção de uma ponte de madeira com a implantação da estrada ligando os dois municípios. Essa ponte de madeira, muito escorregadia, facilitava a ocorrência de acidentes. Mas essa é outra história... 
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3 comentários:

Anonymous disse...

Juqueriquerê deve ter um significado mais rico do que simplesmente PLANTA QUE DORME.
O último elemento da palavra (querê), realmente, parece derivar de QÜEREY = dormir, pegar no sono rapidamente.
Mas não podemos deixar de lado o primeiro elemento JUQUERI.
JUQUYRA = sal
Y = rio
Logo, Juqueri = rio salgado, rio de água salobra.
Tudo conforme o Vocabulário Tupi-guarani - Português, de Silveira Bueno.
Morei no Porto Novo em 1971-1972. O Juqueriquerê tem muito significado para mim.
Um abraço do Paulo Tarcizio da Silva Marcondes
paulotarcizio@gmail.com

Alex Fonseca; Denise Lemes; Fernando Braun disse...

A foto em questão é uma cópia xerox colorida pesquisada no Arquivo Público do Município de Caraguatatuba "Arino Sant'Ana de Barros".

Um abraço da equipe do Arquivo Público.

Denise Lemes disse...

TERMINOLOGIA JUQUERIQUERÊ

Juqueriquerê – Nome da planta dormideira, sensitiva mimosa, segundo Sampaio (1978), mencionado pela socióloga Regina Paes em seu trabalho “Espaço da vida, espaço morte na trajetória caiçara” (UNESP, 1998, p. 56).
Lembrando que ju, de yu, significa espinho (TIBIRIÇÁ, 1984, p.120) e espinhos eram usados como agulhas por indígenas.
Juqueri pode também ser proveniente de juquyra, sal, ~y, rio: o rio salobro, de água salobra. Juqueri é o nome de uma cidade de SP e de um manicômio, assim ficando conhecido como o “Juqueri, hospício de alienados”. A pronúncia comum é juquiri, mais achegada ao tupi juquyry, ou jukyrí, ou ainda jukeri segundo Tibiriçá (1984, p.121), significa espinho de arbusto leguminoso.
O Rio Juqueriquerê, segundo o historiador Jurandyr Ferraz, organizador do livro Santo Antônio de Caraguatatuba – Memória e tradições de um povo, denominava-se Cupuracê. No dicionário de Silveira Bueno, página 113, encontra-se “Cupuracé” que significa: a pedra, o penedo destacado, e ainda “Curupá”: lugar de pedregulhos. A mesma página encontra-se “Curuquerê”, que em tupi, “curú-quer-ê” significa: propenso a dormir, dorminhoco. Enquanto que “quer” significa dormir.
Assim temos então Rio Juqueriquerê: Rio salobro (ao se encontrar com o mar, misturam-se as águas) que dorme (que aparenta calma e sonolência, por ser escuro não se vê suas correntezas e profundidade).

BUENO, Silveira. Vocabulário Tupi-guarani-português. 7ª Edição, Vidalivros: 2008, p. 113, 192, 193 e 519.
FERRAZ, Jurandyr (Organização e Direção) Santo Antônio de Caraguatatuba – Memória e Tradições de um Povo. FUNDACC, 2000.
PAES, Regina. Espaço da vida, espaço morte na trpajetória caiçara. UNESP, 1998.
TIBIRIÇÁ, Luiz Caldas. Dicionário Tupi Português – com esboço de gramática de Tupi Antigo. Traço Editora, 2ª Edição, 1984.

Um abraço! Fica aqui também o convite para que sejam parceiros do Arquivo Público.
Denise Lemes, historiadora