Proibição está no Código de Conduta
para Clientes do Shopping Nova América e é considerada ofensiva pela OAB-RJ,
que pretende oferecer denúncia ao MP
RIO – Um despretensioso passeio, forma
comum de passar o tempo, pode se tornar dor de cabeça para os frequentadores do
Shopping Nova América, em Del Castilho, Zona Norte do Rio. De acordo com uma
das 16 normas que compõem o “Código de Conduta para Clientes” do
estabelecimento, as pessoas que circularem pelo centro comercial sem objetivo
definido podem ser classificadas como “vadias” e solicitadas a se retirar do
local. Caso não concordem em sair, podem até mesmo ser detidas e processadas
por invasão.
O documento diz: “É proibido vadiar
pelo shopping, sem motivo específico para estar presente”. A proibição está
expressa na norma 14 do código, fixado nas paredes dos corredores do centro
comercial. A jornalista Jéssica Moreira viu o documento no último sábado,
quando esteve no estabelecimento e se surpreendeu com as normas.
— Acho natural que o estabelecimento
queira preservar a ordem em suas dependências, mas as regras não podem ser tão
genéricas. O que seria vadiar, no ponto de vista deles? Acredito que impedir a
realização de manifestações que não tenham cunho comercial caso elas não tenham
sido autorizadas pelo shopping é antidemocrático — afirma.
Para o advogado Aderson Bussinger,
vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/RJ, a norma trata os
frequentadores de modo preconceituoso.
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— Essa é uma norma arbitrária. O uso
do termo vadiar é absurdo e fere a dignidade das pessoas. Atualmente, os
shoppings têm substituído as praças como locais para interação social. As
pessoas gostam de ir ver as lojas e passar o tempo nesses lugares. Essas
proibições parecem querer definir o que é legal e o que não é, mas não existe
um Código Penal de Shopping, que eles parecem querer criar. Vale lembrar que os
seguranças desses estabelecimentos não têm qualquer tipo de autoridade policial
— afirma.
Embora o documento não possua uma data
que revele quando ele entrou em vigor, o especialista afirma acreditar que a
norma possa ser uma reação ao movimento conhecido como rolezinho, quando grupos
de jovens marcam pelas redes sociais grandes encontros para passeios em
shoppings, que podem tirar os estabelecimentos da rotina.
— É possível que essa norma pretenda
também evitar a prática dos rolezinhos. Neste caso, ela se torna
segregacionista, porque quer definir o tipo de público que esses
estabelecimentos vão receber, ignorando que ele deve atender a todos os
públicos, sem preconceitos — afirma o advogado, que pretende pedir um parecer
aos demais membros da comissão para oferecer denúncia ao Ministério Público.
POLÊMICA
SEXISTA SOBRE AS ROUPAS
Outra norma polêmica, o texto do item
11 é genérico e dá margem a interpretações variadas. A norma informa que “É
proibido não estar completamente vestido ou usar roupa que possa provocar algum
tipo de distúrbio, ou envolver outros grupos, ou o público em geral em um
conflito aberto”. A professora Hildete Pereira de Melo, do departamento de
Economia da UFF, entende que a medida tem caráter sexista ao fazer crer que as
roupas podem ser motivo de violência.
— Essa redação diz que as roupas podem
causar distúrbio, mas que tipo de roupa poderia gerar qualquer distúrbio?
Historicamente, a mulher sempre é culpada de tudo, desde Eva, mas ela não pode
ser vítima de qualquer tipo de violência por causa da roupa. Em nossa
sociedade, a mulher é estimulada a se vestir como objeto de desejo e, quando
incorpora esse papel, se torna vítima de violência, passível de punição. Bastaria
olhar as vitrines deste mesmo shopping para constatar que papel o consumismo
atribui à mulher – afirma.
Para Bussinger, a norma seria mais
efetiva se explicitasse qual tipo de roupa deve ser evitado. O advogado receia
que a profusão de normas genéricas possa deixar muitas decisões importantes a
critério dos donos dos estabelecimentos, sem qualquer fiscalização.
— Seria razoável se eles proibissem,
por exemplo, o uso de trajes de banho, mas não é isso que acontece. Então, fica
uma margem muito aberta para interpretações, e isso dá um poder muito grande ao
shopping, porque ele passa a poder definir os critérios baseado no que bem
entender — conclui.
Em resposta à reportagem do GLOBO-Zona
Norte, a assessoria de imprensa do Shopping Nova América afirma que “O Código
de Conduta foi elaborado em 2006 e utiliza termos adequados ao período que foi
criado. O empreendimento já estuda a revisão do regulamento devido às mudanças
no comportamento da sociedade e à necessidade de atualizar a nomenclatura.
As normas são válidas apenas nas
dependências do mall e são genéricas, cabendo avaliação de cada caso e analise
das circunstâncias do ocorrido. O Nova América reitera que o Código de Conduta
tem como objetivo proporcionar um ambiente de conforto e bem estar a todos os visitantes
e funcionários, além do bom funcionamento do shopping”.
Fonte: www.jusbrasil.com.br
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