Como em
todos os grandes jardins, no de Rose Noronha cada uma de suas flores conta uma
história
A investigação da Polícia Federal que abriu à visitação o
jardim de Rose Noronha, a chefe do escritório da Presidência da República em
São Paulo, produziu um mapa para o estudo do patronato companheiro. Desde o
estouro da quadrilha, em novembro passado, 25.012 interceptações telefônicas
expuseram uma rede de capilés que vão da privataria no porto de Santos à
Advocacia-Geral da União.
Há nela o caso da ilha das Cabras, um bem da Viúva, com uns
50 mil m², no litoral paulista. "Cabras" foi concedida ao milionário
ex-senador Gilberto Miranda (PMDB-AM). O doutor ganhou o mimo há mais de 20
anos, construiu um heliporto, um deque e ergueu uma mansão. Em 1995, a
propriedade foi avaliada em R$ 10 milhões e, desde então, o Ministério Público
contesta o usufruto desse paraíso particular.
O doutor batalha pela
sua ilha. Conseguiu até uma lei da Assembleia Legislativa, mas o então
governador Mario Covas vetou-a. Nos últimos anos, recorreu ao companheiro Paulo
Vieira, diretor da Agência Nacional de Águas, flor do jardim de Rose que, por
sua vez, estava na rede de amigos do comissário José Dirceu e de Nosso Guia.
Em abril passado,
Miranda preocupou-se com sua posse, que precisava de um parecer da
Advocacia-Geral da União: "Nós estamos perdendo", mas Vieira
tranquilizou-o: "Por que você exige tanto do pobre de mim?... Relaxa
homem, relaxa que vai dar certo."
Em maio, quando o
Supremo Tribunal Federal preparava o julgamento dos mensaleiros, Vieira
propusera a Rose "parar o Brasil": "O julgamento é político e
que eles [ministros do STF] não vão sair de lá ilesos" (...) o negócio
agora é tumultuar o processo".
Gilberto Miranda
pedia a Vieira "um tiro de canhão" para garantir-lhe a ilha das
Cabras. Segundo Rose, a essa época o donatário ajudava a aliviar os penares do
comissário José Dirceu, oferecendo-lhe ajuda de advogados.
Quando estava em
Brasília, Miranda se celebrizou pela generosidade com que emprestava seus
jatinhos. Os repórteres Fausto Macedo e Bruno Boghossian acabam de revelar
trechos de telefonemas de um assessor de José Dirceu para Gilberto Miranda no
dia 9 de novembro passado:
"O Zé não estava
querendo descer lá no Santos Dumont, entende? Cinco horas da tarde é um
problema porque ele vai chegar lá às 18h40, é um problema..." Mais
adiante: "Não tem ninguém domingo às 9h30, não tem ninguém no Santos
Dumont".
Uma mordomia aérea
jogou o comissário no registro de uma trama em que não precisava ter entrado.
No dia 14, Vieira recebeu um telefonema do braço direito do advogado-geral da
União: "Consegui". Em seguida, ligou para Miranda: "Tá sentado?
Você não sabe da maior. O consultor da União modificou e se manifestou a favor
nosso, tá?"
De fato, um novo
parecer atendera aos seus interesses. Nesse mesmo dia, Dirceu precisava de
outro avião, mas o do ex-senador estava indisponível.
Nos dias 19 e 21,
Paulo Vieira contaria que Rose pedira emprestados R$ 650 mil em dinheiro porque
"comprou um apartamento novo em Higienópolis".
Na manhã do dia 23, o
advogado-geral-adjunto da União, José Weber Holanda, acordou seu chefe, Luís
Inácio Adams: "Eu estou com uma busca e apreensão na minha casa, da
Polícia Federal. (...) Estão vasculhando tudo". Seria "alguma coisa
ligada com a ilha das Cabras".
Era.
Folha/Elio
Gaspari
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