segunda-feira, 9 de julho de 2012

Quem pode o mais, pode o menos

Uma lei da Câmara de Caraguá em vigor desde 27 de janeiro de 2012 proíbe a campanha política em muros particulares da cidade

De autoria do vereador Pedro Ivo, a Lei 2004 diz textualmente em seu artigo 1º: “Fica proibida a pintura de muros em via pública com propaganda eleitoral, assim como a colocação de cartazes, banners, faixas ou similares em próprios públicos, pontes, viadutos ou postes de iluminação pública”.

Na época, ela foi sancionada tacitamente pelo prefeito Antonio Carlos e promulgada pelo presidente da Câmara, Wilson Gobetti.

Sanção tácita é quando o prefeito “lava as mãos”, não promulgado nem utilizando do seu poder de veto em quinze dias para tentar impedi-la de entrar no mundo jurídico. Diante do silêncio do chefe do Executivo, a Câmara acabou tendo de promulgar e publicá-la, nos termos em que foi aprovada pelo poder Legislativo.

Não é porque o prefeito tenha “lavado suas mãos” que a lei promulgada pela Câmara tem menor valor ou menos poder para obrigar ao seu cumprimento. É lei. E como tal opera todos os efeitos jurídicos.

Nem cabe à Justiça Eleitoral, a pretexto de cumprir legislação federal –ou, o que é pior, cumprir até meras resoluções desprovidas do rigorismo do processo legislativo– deixar de respeitar a norma municipal aplicável à espécie.

Um argumento contra sua validade –e, portanto, opondo-se ao seu cumprimento nesta campanha eleitoral–, é que ao município não é dado legislar sobre matéria eleitoral. A iniciativa, neste caso, seria tão-somente da União.

Numa análise apressada até se poderia concluir trata-se de matéria eleitoral. Todavia, um estudo mais detido aponta em sentido contrário. No sentido de que, em verdade, estamos diante de matéria envolvendo pura e simplesmente questão urbanística municipal.

Ao proibir a inscrição política em muros da cidade, o município não está inviabilizando a candidatura deste ou daquele em particular – todos continuam em pé de igualdade, pois a vedação obriga indistintamente.

O município, neste caso, está somente protegendo o seu aspecto estético e urbanístico, competência que somente ele, o município, detém. Não cabe ao Estado nem à União imiscuir-se neste assunto. A eles, sim – União, Estado – falta competência para tanto. A questão é tipicamente municipal.

De há muito critica-se o excesso de placas, outdoors, cartazes, faixas, luminosos, inscrições, pichações e o diabo-a-quatro que se vêem espalhados por aí, sem regramento, que apenas enfeiam a cidade. Ademais disso, e o que é pior, tiram a atenção e ainda desorientam transeuntes e motoristas. No fim das contas, não passam de um amontoado de lixo, de poluição visual, a comprometer o aspecto urbanístico. Uma situação tolerada em nome apenas dos apelos e interesses propagandísticos menores.

O prefeito de São Paulo, que andou fazendo uma “limpa” pelas ruas da capital, foi até elogiado por sua ousadia quando decidiu retirar tais entulhos das vias públicas. E, o resultado, sumamente positivo, foi comemorado pela população. A despeito, é verdade, de uma minoria interessada na continuidade daquela bagunça visual, que rendem dividendos à custa do coletivo.

Quando se fala em estética urbana, está também se falando em meio ambiente urbano. Qualquer estudioso do assunto, por mais desatencioso que seja, sabe que em termos ambientais vale sempre a regra mais restritiva. No caso presente, da propaganda política em muros, mais restritiva é a lei municipal. Portanto, é a que vale, a que prevalece sobre todas as outras.

A justiça eleitoral, que já baniu dos palanques o “showmício” –prática de trazer cantores e bandas para tocar para candidatos obterem votos–, que expurgue também –e de vez por todas– a prática igualmente nociva, poluidora, de se espalharem inscrições de candidatos pelos muros da cidade, as quais muitas lá permanecem, mesmo depois de passadas as eleições.

Um argumento bastante significativo, a favor da validade da lei municipal regulando a questão, é o fato de ter sido atribuída aos municípios a palavra final na fixação do número de cadeiras dos vereadores nas câmaras municipais.

Fixar o número de cadeiras de vereadores nas câmaras municipais não é “legislar em matéria eleitoral”?

Afinal, é o número de cadeiras que estabelece o indispensável quociente eleitoral, que é o número mínimo de votos que um partido precisa receber para eleger um vereador. É também o número de cadeiras que vai indicar o número de candidatos que um partido vai poder lançar nas eleições.

E isso não é competência municipal concedido pela própria constituição federal? Não seria “matéria eleitoral”? Então, por que insistem em afirmar que o município não pode legislar em questões eleitorais?

Ora, quem pode fixar o número de vereadores, o número de candidatos, o quociente eleitoral –que tem competência inquestionável para isso–, pode também vedar a propaganda em seus muros. Caso, obviamente, se considere proibir propaganda em muros matéria eleitoral e não questão urbanística.

Há um brocardo jurídico que ilustra bem esta questão: quem pode o mais, com mais razão pode o menos.

Pensemos nisto...
João Augusto Neggri
Para o Caraguablog

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