segunda-feira, 2 de julho de 2012

Passe do idoso: havendo lei municipal, o direito pode iniciar aos 60 anos


O estatuto diz que basta uma lei municipal para que  idoso tenha passe livre nos ônibus a partir dos 60 anos. Caraguá fez a lei e o Tribunal de Justiça disse que ela não vale, baseado sabe-se lá em quê...

Tecemos comentários há alguns dias sobre o direito do idoso em valer-se do transporte coletivo urbano. Na oportunidade, dissemos que a Lei Orgânica de Caraguatatuba estava desatualizada em seu artigo 206, onde está previsto que o direito pode ser exercido a partir dos 60 anos de idade. (veja matéria)

Dissemos ainda que um processo movido pela empresa de ônibus local retirou os efeitos dessa previsão da lei orgânica, que fora ali inscrito a partir de uma emenda, a de número 38, de autoria do então vereador Carlinhos da Farmácia. O julgamento foi do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com efeitos a partir de 18 de março de 2009.

Assim, concluímos, o direito do idoso em andar de ônibus urbanos gratuitamente somente seria possível a partir dos 65 anos de idade, conforme está escrito na Constituição Federal. A legislação municipal não teria validade alguma diante da deliberação do Tribunal.

Pois bem.

A questão parece não ser bem essa. Numa análise mais detalhada, verificamos que o Estatuto do Idoso, instituído no país pela Lei Federal nº 10.471, em 1º de outubro de 2003, estabelece, sim, que o idoso de 60 anos pode ter o transporte municipal gratuito, desde que uma lei municipal disponha sobre o assunto. No nosso caso, tinha.

Eis o teor do artigo 39 e §§ do referido estatuto:

Art. 39. Aos maiores de 65 (sessenta e cinco) anos fica assegurada a gratuidade dos transportes coletivos públicos urbanos e semi-urbanos, exceto nos serviços seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos serviços regulares.


§ 1º Para ter acesso à gratuidade, basta que o idoso apresente qualquer documento pessoal que faça prova de sua idade.


§ 2º Nos veículos de transporte coletivo de que trata este artigo, serão reservados 10% (dez por cento) dos assentos para os idosos, devidamente identificados com a placa de reservado preferencialmente para idosos.


§ 3º No caso das pessoas compreendidas na faixa etária entre 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, ficará a critério da legislação local dispor sobre as condições para exercício da gratuidade nos meios de transporte previstos no caput deste artigo. (g.n.)

Ao remeter para a legislação municipal a possibilidade de dispor sobre a gratuidade no transporte coletivo urbano em benefício do idoso a partir dos 60 anos, estabeleceu-se a competência do município para legislar sobre a questão.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, fazendo ouvidos surdos ao mencionado Estatuto, decidiu de maneira diferente. Com isso, houve um desrespeito à competência municipal para tratar do assunto e um acinte ao próprio Estatuto do Idoso.

Como já disse alguém, da Justiça só se espera decisão tardia, não necessariamente justiça. É o caso presente. A lei municipal cuidou da questão e o TJ, contudo, considerou inconstitucional o procedimento. E olha que não foi qualquer leizinha a conferir o direito. Foi a própria Carta Fundamental do município, a sua lei de organização.

Uma vez prevista a gratuidade na Lei Orgânica, bastaria o prefeito regulamentá-la, talvez até compondo-se com a concessionária dos serviços de transporte público para minimizar eventuais efeitos prejudiciais ao faturamento da empresa.  Mas, desconsiderar a lei criada, jamais.

Afinal, o transporte público é uma concessão do poder público municipal, e este pode rever o contrato a qualquer momento e até mesmo encampar a empresa prestadora dos serviços. A competência para isso é exclusiva do município.

Quando o município, através da sua Lei Orgânica, deu o direito a partir dos 60 anos, na verdade criou uma obrigação para si próprio. É neste ponto que entraria a composição com a empresa prestadora dos serviços de transporte coletivo, que não teria obrigação alguma de arcar sozinha com eventuais prejuízos.

Agora, retirar a previsão da Lei Orgânica, como fez o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, lavando suas mãos, é simplesmente inominável, uma atitude desastrada e até desrespeitosa ao ordenamento jurídico vigente.

O direito daqueles que têm mais de 60 anos estava corretamente inscrito na Lei Orgânica Municipal e bastava apenas uma regulamentação para dispor sobre a sua operacionalidade.

A nossa justiça julgou errado. Não surpreende mais esta aberração. De há muito ela vem escrevendo torto e por linhas igualmente tortas.

Como diria o Bóris Casoy: uma pena...

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