domingo, 27 de maio de 2012

Medo de desapropriações é tema central na Audiência Pública do Contorno


Moradias que serão afetadas, valores a serem pagos, reassentamento daqueles que não têm titularidade da terra imperaram durante a discussão da área a ser atingida em São Sebastião

Mara Cirino/Jornal Imprensa Livre – 23/5/12
 A preocupação sobre as reais áreas a serem afetadas com as desapropriações para a construção do Contorno Sul, no trecho de São Sebastião, foi o principal mote da audiência pública realizada na noite de segunda-feira, no Teatro Municipal. O encontro reuniu mais de 600 pessoas, sendo desta vez, moradores dos bairros Enseada, Morro do Abrigo e região da Topolândia, locais que devem ter maior interferência da obra a ser executada pelo governo do Estado.

A audiência foi conduzida pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema), contou com a explanação do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) dos técnicos do Desenvolvimento Rodoviário S/A (Dersa) e da JGP – responsável pela elaboração do documento e durou cerca de quatro horas.

“Nossas vidas estão paradas por conta deste projeto. Deveria começar logo o cadastro para a gente saber o que vai fazer e quem está sofrendo com isso é a classe mais desfavorecida. Minha casa está próximo da área, mas não sei se vai ou não ser atingida. Temos de nos preparar psicologicamente”, disse o morador Edvan Silva de Jesus.

Preocupado também se mostrou Oziel Cristino de Oliveira. Ele destacou que levou anos para construir sua casa e não quer uma habitação popular. “Vocês precisam deixar claro os locais para onde poderemos ser transferidos, quem será afetado, mandar alguém para conversar com os moradores para explicar o que de fato vai acontecer com cada um. É uma questão de igualdade e respeito”.

Varlez Brandão Santos destacou a passagem da obra pelo Jaraguá ao lado do Centro de Controle de Zoonoses e do Posto de Saúde. “Vai acontecer como no Rodoanel. É bom lembrar que aqui tem uma vida de trabalho. A maioria dos moradores é imigrante, tem sua posse cadastrada, mas como vai ter a titularidade da terra?”, questionou.

Já o professor Hipólito Carvalho Santana foi mais além. “Costa Norte só recebe estrada, lixão, usina. Tá na hora de se mobilizar porque aqui o que nós vemos é um terror. A população está apavorada. Cadê o Estudo de Impacto Humano? A força econômica do planalto vai matar uma região”.

Morador da Topolândia, João Amorim destacou que “o Estado tem de parar de manipular a população sebastianense, enrolando e não falando nada. Topolândia é o lugar mais afetado e temos de bater o pé para termos resposta. Não somos contra o projeto, mas por que não pegam o traçado antigo? Parem de brincar. Esta conta São Sebastião não pode pagar! Façam corretamente a estrada que é importante para a região”.

Mais alterações no traçado, inclusive com a descida passando por dentro das instalações da Petrobras (Tebar) foram algumas das sugestões apontadas durante a audiência. “Ela é a grande causadora do impacto ao tomar mais de 50% da área útil da cidade”, disse Eduardo Melchert.

Irônico, Marcelo de Oliveira Ferreira chegou a sugerir fazer uma ponte mais alta para fazer os apartamentos. “É para lá que vão morar as pessoas que terão de sair de suas casas porque isso que estão propondo aqui não é para mim, para meus filhos, mas para quem vem para a temporada”.

O público ainda questionou as empresas responsáveis pelo EIA/Rima sobre um traçado mais longo com túneis para evitar as mais de 640 desapropriações previstas, com base em atualização de 2009.

O secretário do Meio Ambiente de São Sebastião, Eduardo Hipólito do Rego, tomou a palavra para falar como cidadão e ambientalista. “Falamos tanto de sustentabilidade e esse projeto só vê a área comercial, não leva em consideração a questão humana e nem a ambiental”.

Segundo ele, foram feitas várias solicitações para deixar os túneis, mas comercialmente não é bom para a empresa. “Se fizerem isso o projeto fica mais caro, mas quanto custa pessoas que têm teto para morar e terão de sair de suas casas? Quanto custa manter uma floresta em pé? Não, isso não é problema nosso, eles que se virem e paguem para ter a estrada que querem fazer. Deixem nosso patrimônio em paz e põe esse troço debaixo da terra!”, concluiu.

Reassentamento
O gerente institucional da Dersa, Ermes Silva, explicou aos presentes os procedimentos para desapropriações, que ocorrem só no caso de a pessoa ter a titularidade da terra. Desta forma será indenizada pelo valor de mercado. Caso seja área de posse, as famílias são retiradas e vão para uma área de reassentamento construída em parceria com a Companhia de Desenvolvimento Habitacional Urbano (CDHU) em área titulada, sem nenhum ônus para os reassentados. Neste ponto, os questionamentos foram justamente sobre a falta de áreas com essas características em São Sebastião.

Quanto ao clamor da população, a socióloga da empresa JGP, Ana Maria Iversson, destacou que as audiências são o primeiro processo para adequar o projeto para receber sugestões e ver a sua viabilidade antes de receber a Licença Prévia (LP). “Só após esse licenciamento começa a etapa de levantamento de dados, cadastros dos moradores e das áreas a serem ocupadas. O momento para pleitear as alterações é agora”, destacou.

Para minimizar impacto, desemboque pode sair no Topovaradouro
Uma das alternativas para evitar as centenas de desapropriações previstas para a região da Topolândia é levar o acesso até o bairro do Topovaradouro e depois fazer a saída para chegar ao Porto de São Sebastião. Essa foi uma das análises feita pelo prefeito de São Sebastião, Ernane Primazzi, que entende que ali o impacto seria menor.

“Não é nada definido, mas as sugestões têm de aparecer e este é o momento para levantarmos todas as possibilidades”, disse logo após o encerramento da Audiência Pública. Primazzi também é favorável à formação de uma comissão que possa discutir com mais propriedades os impactos e das sugestões para melhorar a obra de implantação do Contorno Sul no município.

“Não há mais possibilidade de fazer discussões de cunho político. Elas precisam ser técnicas e objetivas porque o contorno não tem como deixar de ser executado. Caso contrário, vamos ter caminhões congestionando nosso trânsito e gente reclamando de ficar parado mais de uma hora na avenida”, destacou.

O novo traçado conta com quatro túneis, cinco interseções, cinco pontes e 31 viadutos, em uma extensão de aproximadamente 31 quilômetros. Segundo o prefeito, cerca de 90% dos pedidos feitos pela administração foram acatados, inclusive com a retirada da alça de acesso que seria executada no bairro São Francisco.

Um ofício também foi protocolado pelo secretário municipal de Meio Ambiente, Eduardo Hipólito do Rego, com mais de 15 itens para serem avaliados em relação à execução da obra. De acordo com Hipólito, não foi dada à secretaria, órgão ambiental local, a oportunidade de elaborar seu exame técnico, previsto na Resolução Conama nº 237/97, aplicado por analogia aos licenciamentos estaduais.

“O EIA, da forma que foi proposto, não atende a Legislação e aos princípios do Direito Ambiental, apresentando-se demasiadamente falho, resultado da ausência total de diálogo com os municípios da área de influência. Além disso, como instrumento de política pública perpetua uma obra de pouca integração e desprovida do necessário estudo de alternativas para mobilidade urbana”.

Falta de estudo de controle de ruído, proximidades dos desemboques em locais com menos de 200 metros das residências, falta de acessos vicinais para a execução de obras de túneis e bota-fora sem indicação, entre outros, também foram protocolados pela secretaria. (M.C.)

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