Deu no Estadão
O paredão de Mata Atlântica
que recepciona quem chega a São Sebastião, no litoral norte paulista, está
diferente. O verde tradicional está salpicado de cinza. Aqui e ali, em meio a
copas frondosas, esqueletos ressequidos perturbam a vista e denunciam um
problema ambiental: os guapuruvus estão morrendo.
Espécie tradicional daquela
vegetação, essa árvore (Schizolobium parahybae), que tende a ficar mais alta que
a maioria, é facilmente reconhecida pela florada amarela que colore a mata no
fim do inverno. Há uns três anos, de repente, começaram, uma a uma, a perder as
folhas, secar, descascar e morrer.
O problema foi inicialmente
observado no norte de São Sebastião, mas depois disso já se alastrou até as
praias ao sul do município, atravessou o mar e atingiu Ilhabela. E já foi
detectado no Jardim Botânico, em São Paulo. Ocorre tanto na mata fechada quanto
na área urbana e na beira de estradas, ameaçando cair sobre casas e carros.
Veja também: Impacto ecológico e Social >>>>>..
Sem motivo aparente, o
misterioso declínio dos guapuruvus preocupa caiçaras - que tradicionalmente
usam árvores caídas ou derrubadas com autorização do órgão ambiental para fazer
canoas - e técnicos ambientais, que desconfiavam tanto das mudanças climáticas
quanto de alguma praga nova. "Parece uma nuvem que vem descendo e matando
todos os guapuruvus. Atinge quase 100% das árvores por onde passa", conta
o engenheiro agrônomo Mauricio Rubio Pinto Alves, da Casa da Agricultura de São
Sebastião e Ilhabela.
Ele e o engenheiro florestal
Silas Barsotti Barrozo, da Secretaria do Meio Ambiente do Estado, recorreram ao
pesquisador Francisco Zorzenon, do Instituto Biológico, especialista em pragas
urbanas e agrícolas. O biólogo propôs uma hipótese ainda não confirmada: um
pequeno besouro (uma microcoleobroca da espécie Platypus sp), comum na Mata
Atlântica, estaria inoculando um fungo nos guapuruvus que seria o responsável
pela sua morte.
Segundo Zorzenon, o besouro
perfura o tronco da árvore, põe seus ovos, e as larvas que nascem se alimentam
do tecido lenhoso da árvore. Juntamente com os ovos, os besouros também
inoculam um fungo dentro da árvore, que servirá depois de complemento alimentar
para as larvas. A suspeita é de que o fungo leve a árvore à morte.
Para testar essa teoria, ele
espalhou armadilhas pelos guapuruvus para coletar as brocas. "Ao
analisarmos no laboratório, vimos que alguns deles realmente carregam um fungo
que é patogênico. Mas se é ele que está causando o problema ainda não sabemos e
continuamos investigando", conta.
Zorzenon lembra que esse
comportamento das brocas é comum, então ou se trata de um fungo novo, mais
agressivo, ou é um organismo conhecido, mas que agora, por algum motivo, as
árvores estão mais suscetíveis a ele. "Pode haver algum estressor
ambiental", explica.
Impacto ecológico e Social
O guapuruvu é uma espécie de
árvore pioneira, ou seja, quando uma área de mata é aberta, ela é a primeira a
ocupar aquele solo, protegendo-o para que outras espécies possam se desenvolver.
Por isso, não vive muito tempo, chega a uns 60 anos no máximo. "É natural
no processo de dinâmica de sucessão das árvores que ele vá diminuindo com o
amadurecimento da floresta. Mas o que está acontecendo agora é completamente
diferente", afirma Barrozo.
Os caiçaras estão aflitos com
a possibilidade de perder a árvore que usam tradicionalmente. "Acho que
eles vão voltar, vemos vários brotinhos nascendo, mas até atingir o tamanho
para virar canoa não vai ter mais ninguém aqui para poder usar", lamenta
Josias Marcelino de Matos, que há 55 anos trabalha no feitio de canoas.
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